O barulho vem de jegue
Clotilde Tavares | 21 de julho de 2009Ontem à noite estava eu muito bem sentada às nove da noite vendo minha série favorita na TV. Na segunda feira, vejo C.S.I às oito no AXN, Medium às 9 no Sony e The Mentalist às 10 no Warner. Então eram nove horas em ponto e o capítulo de Medium mal havia começado quando um barulho ensurdecedor começou na rua em frente ao meu prédio.
Fui olhar o que era. No meio da rua, dividindo a faixa com os carros, estava estacionada uma carroça, puxada por um animal. A carroça era toda ornamentada e portava um equipamento de som. O cavalo também estava vestido a caráter, enfeitado que só jumento de cigano. De pé, um homem enfeitadíssimo, com uma roupa cheia de lantejoulas que me pareceu aquelas coisas mexicanas: chapelão enorme, colete, calças justas, enfim, um “mariachi”. Pelo menos foi essa a visão que tive da minha varanda, no sexto andar.
O motivo da balbúrdia eu fui entendendo aos poucos. Alguém no prédio aniversariava – era um aniversário de casamento – e o “Tele-jegue”, que era o nome da “coisa”, estava ali, contratado por alguém, para fazer a homenagem ao casal. O “locutor” fazia piadas, sendo que eu jamais imaginei que um casal completando 35 anos de casados gostasse de ouvir piadas daquele tipo. As piadas eram entremeadas com músicas, que pareciam ser religiosas, desse tipo de música chata que as pessoas quando ouvem levantam os braços e balançam de um lado para outro. Na calçada, havia onze pessoas, incluindo o casal homenagado. O prédio tem 80 apartamentos; a quatro moradores cada, são 320 pessoas, das quais pelo menos trezentas aguentaram a barulheira sem terem nada com ela.
Entre uma música e uma piada, o “tele-jegueiro” anunciou que estava incrementando ainda mais a carroça, que em breve ela teria um palco, um sistema próprio de iluminação, máquina de fumaça e um som ainda mais potente “para animar ainda mais a sua festa”. A função durou 45 minutos, e eu perdi o episódio que estava assistindo na TV.
É por isso que eu, apesar de gostar muito do Brasil, às vezes tenho vontade de morar num país civilizado somente pra ter a experiência. Aquela coisa que a gente vê nos filmes: um barulhinho a mais numa vizinhança residencial, com cinco minutos a polícia está na porta, muito educada mas muito firme, pedindo explicações e acabando com o fuzuê. Aqui, liga-se para a polícia, não é com ela; liga-se para a SEMAN, estão sem carro para atender.
Ao feliz casal, mesmo deplorando seu mau-gosto, ou de quem lhes ofereceu o presente, meus parabéns pelos 35 anos de união. Falizmente no próximo ano, quando completarem os 36 anos, eu não estarei mais aqui, para presenciar vexame semelhante e ser impedida no meu direito de cidadã pagante de impostos de assistir meu programa preferido na TV.
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Bem, nesses países pelo menos a gente tem por quem chamar! Aqui, ficamos à mercê dos barulhentos e dos sem-noção.
Deve ter sido um espetáculo bizarro, mesmo! Também despertou-me a curiosidade para ver a decoração do serviço de tele-jegue.
Olha, posso te dizer por experiencia própria que morar em um país civilizado nao significa que a populacao civilizada. Em um país dito de primeiro mundo as coisas só funcionam porque as leis sao severas com multa pra tudo. Provavelmente é o único jeito de disclipinar a populacao.
Abracos,
Mauricio
É claro que é presente de grego.
É preciso ser muito sem noção para gostar daquilo.
Há relatos de pessoas que se trancam no quarto, no escritorio ou no banheiro e não saem de jeito nenhum para receber a “homenagem”.
Clotilde
É uma forma bem original, mas não menos criativa e indiscreta de se comemorar seja lá o que for. Pra seria um presente de grego. hahahahha. Fiquei imaginando as piadas…
Abraço
Não tem quem escape dessa tal de poluição sonora! Eu pensava que fosse só aqui em Pernambuco, mas já vi que o problema é mais extenso… Aqui também, se a gente liga pra PM, respondem que só tem viatura pra atender coisas mais graves (como se não fosse muito grave a gente perder o sossego e a saúde!), mandam ligar pra DIRCOM, que tbm não faz nada…E por aí vai. Mas esse tipo de poluição, usando jegue, eu ainda não conhecia…
Sorte sua, que vai se mudar!
Clotilde, tirou fotos? Fiquei com vontade de ver a “arrumação” do Tele-jegue.